terça-feira, fevereiro 22, 2005

204. Alguém duvidava de que eles são assim?

Mário Soares, há pouco, na SIC, em resposta a pergunta sobre o facto ter sido intencional ou não o apelo que fez à maioria absoluta do PS, quando no domingo foi votar:

- Claro que sim. Eu não sou mentiroso. Era aquilo que eu queria.
(a transcrição não é textual, mas não adultera a substância).

Este é o senhor a que muitos chamam “pai” da democracia portuguesa. “Pai” que não respeita a “filha” e que nem se dá ao trabalho de mostrar algum pudor, disfarçando-o. “Pai” que é capaz de “desonrar a filha” desta forma abrupta e, não contente com isso, ainda do facto se vem jactar, com a arrogância que se vê. Com "pais" assim, como é que queriam que a "filha" estivesse, se não a calcorrear as ruas da amargura e da ignomínia?

Neste processo que conduziu à eleição do PS, tudo valeu. Foram ultrapassadas todas as barreiras da decência. E toda a confraria se juntou e não olhou a meios nem poupou esforços.

A começar por Belém e a acabar no Campo Grande.

Portugal está bem entregue. Agora, sim, está mesmo muito bem entregue.

9 comentários:

Anónimo disse...

Não pertenço a nenhuma confraria e votei no Partido Socialista. Estou a aguardar serenamente e COM CALMA!!! a constituição do novo Governo DE PORTUGAL!!!
Não fui para a rua festejar...porque esta merda de País mal governada..não nos permite festejos.

Vá lá...não seja ressabiado.

Obs* O Tal de Mário Soares a que se referia será o mesmo em que eu estou a pensar? Nãaaaaa não pode ser. O que eu estava a pensar..a esse devo-lhe muito! A ele e a outros lutadores pela liberdade. Agora...é como abrir a torneira e sair água....

VIVA A LIBERDADE!

Ruvasa disse...

Não estou a referir-me aos eleitores socialistas. Que esses, tal como eu, limitam-se a votar, como qualquer cidadão comum decente.

Refiro-me apenas a quem tem bem maiores obrigações do que essas. É que noblèsse oblige. Mas somente a alguns, que os outros, sabe-se como é.

Mas o Amigo compreendeu-me perfeitamente, pelo que não há razão para que seja necessário elucidá-lo melhor, pois não?

O tal de Mário Soares, não sei se será esse de que fala, mas, se não o ouviu, tente ouvir da próxima, e depois ajuize.

Ruvasa disse...

Caro Anónimo !

Logo que deixe de o ser, terei todo o gosto em lhe dar a resposta que o seu post quis suscitar.

cumprimentos

Anónimo disse...

Caro Ruvasa,

"Portugal está bem entregue. Agora, sim, está mesmo muito bem entregue"

E durante estes 3 anos esteve bem entregue?

José Manuel, 43 anos, Arquitecto, Lisboa

Ruvasa disse...

Ora, então, viva, José Manuel, 43 anos, arquitecto, Lisboa.

Como prometi, cá venho responder. E só o não fiz mais cedo, porque tive que me ausentar para mais de 250 quilómetros daqui e só regressei há pouco.

Pois bem, vejamos:

- << Portugal está bem entregue. Agora, sim, está mesmo muito bem entregue. >> - disse eu

- << E durante estes 3 anos esteve bem entregue? >> - perguntou o amigo José Manuel.

Respondo eu:

<< - Realmente, podia ter estado melhor, não fora a circunstância de, a antecederem esses três anos, terem estado outros 6 anitos. >>

E, já agora, acrescento:

<< - Podem voltar a desperdiçar à vontade e adiar tudo e mais alguma coisa que, a gente, depois, volta para endireitar, se o PR de então deixar, claro!... >>

;-)

cumprimentos

Anónimo disse...

“Realmente, podia ter estado melhor, não fora a circunstância de, a antecederem esses três anos, terem estado outros 6 anitos”
A velha história do passado herdado! Não querendo parecer sobranceiro, gostava de lembrar que um senhor chamado Sá Carneiro afirmava peremptoriamente que a desculpa dos outros apenas servia para os primeiros meses — depois a responsabilidade tinha de ser assumida.
Também não se percebe, porque reclama tanto o PSD por reformas que não foram feitas nos tais 6 anos, quando os governos liderados pelo Sr. Silva (que presumo ser a grande referência do PSD e ainda ser filiado no PSD?) com duas maiorias absolutas e recursos abundantes, principalmente de fundos comunitários, não as fez!
E também não se percebe onde esteve a oposição do PSD durante esses 6 anos, porque não lhe são reconhecidas propostas de monta para as tais reformas. Durante esses 6 anos apenas se conhece as convulsões dentro do partido, as guerras internas, e as disputas de liderança entre José Barroso (o não desertor, porque foi para um emprego melhor) e Santana Lopes (a tal mistura de Gabriel Alves com Zandinga, utilizando as palavras do José Barroso).

“Podem voltar a desperdiçar à vontade e adiar tudo e mais alguma coisa que, a gente, depois, volta para endireitar, se o PR de então deixar, claro!”
É sabido que o PSD é um partido redentor e competente! A prová-lo estão 3 anos de governo:
a) o défice está abaixo do PEC (!) com a utilização sucessiva de engenharia financeira através do recurso a receitas extraordinárias. A título de exemplo, segundo o Diário Económico de 25/02/2005 a saída do fundo de pensões fez com que a CGD registasse perdas e perdesse a liderança do sector bancário;
b) a fuga aos impostos aumentou e a cobrança fiscal diminuiu (!) de forma acentuada, isto apesar da contratação de 2 super gestores vindos do privado com salários do privado (um do BES e outro do BCP); a estes super gestores ainda devem ser imputados outros danos colaterais: o colapso da rede informática e a emissão de 6 milhões de contos de devolução de impostos a empresas que a eles não tinham direito;
c) o concurso de professores e a sua colocação correu (a)normalmente (mal !) com uma triste imagem para a Sra. Ministra e sem o apuramento das devidas responsabilidades — provavelmente, algo que nunca será conhecido em toda a sua dimensão;
d) o emprego aumentou (!), principalmente para o cartão laranja (e azul), com salários acima das tabelas da função pública — desgraçados dos restantes que viram as empresas fechar e olhando para as estatísticas viram o desemprego aumentar;
e) para a reforma da administração pública foi nomeado um senhor de seu nome Deus Pinheiro — primeiro sinal de que José Barroso não queria fazer nada na reforma da administração pública; foi imposto um novo sistema de avaliação por quotas e que excluía as chefias — também convém, porque estas são nomeadas pelos partidos; triste modelo que esquece que os serviços são o espelho de quem as dirige!
f) ...

Por isso esqueça. O PSD tal como o PS também falhou e também cometeu erros. Falha como os outros. Por isso, poupem-nos da vossa salvação, da vossa capacidade e da vossa competência. Tentem apenas dar o vosso melhor e esqueçam a vossa arrogância.
Reconheçam o óbvio: se não tivessem sido os dislates do Governo liderado por Santana Lopes, Sampaio não teria interrompido a legislatura. Apesar de esta premissa ser óbvia, torna-se necessário lembrá-la aos líderes cessantes do PSD — aos seus membros e partidários — que continuam a responsabilizar o Presidente da República pela sua derrota. Será que não sabem assumir as suas próprias responsabilidades!

José Manuel, 43 anos, arquitecto, Lisboa

Ruvasa disse...

Viva, José Manuel !

Pequena nota, sem acrimónia, antes com alguma tentativa de humor:

Para quem começa por dizer que… ora deixa cá ver o que é disse, ora deixa cá ver… Ah, já sei: “Não querendo parecer sobranceiro”, o amigo José Manuel logo resvalou e se estatelou ao comprido, assim se deixando ficar até ao fim. O que disse e a forma como disse não é sobranceria? Então, o que é?

"Adelante, Rocinante", que há muitos moinhos para abater!...

É verdade que Sá Carneiro afirmou isso. Mas não o é menos que, embora tenha assumido a liderança do governo em condições nada favoráveis, não encontrou o país nas mesmas condições de pressão exterior (entenda-se da UE) que se deparou a Durão Barroso, quando, ao chegar a S. Bento, teve logo sobre si a espada de Dâmocles das penalizações pelo descontrolo total em que tudo se encontrava, com o deficit orçamental em tais condições que, ou se comprometia a, desse lá por onde desse, trazê-lo – ainda que com engenharias financeiras – para patamar inferior aos célebres 3%, ou o país sofreria consequências extremamente danosas em matéria de fundos comunitários e “d’autres choses”. De tal forma foi o aperto que quase não houve possibilidade de algo fazer mais, em quase todos os 8 meses que faltavam para o fim do ano de 2002. Aflição das aflições!

Ora, meu amigo, quem foi que deixou o país nessas condições e se pirou a sete pés, assustado com o ponto a que tinha levado as coisas e porque se estava a entrar no famigerado pântano?

Portanto, como dizia Sá Carneiro, a responsabilidade teria que ser assumida e foi-o. Só o pegar nas coisas como estavam foi uma bela assumpção de responsabilidade, coisa que não se verificou noutras latitudes. Não concorda?

Viveram-se, pois, tempos difíceis, de grande aperto de cinto, com quem não teve culpa do estado a que as coisas tinham chegado, a ter que fazer das fraquezas forças e a arranjar ânimo para arrostar com tantas dificuldades. Todo o fel que havia para engolir o foi durante dois anos, a primeira parte do mandato, como sabe.

Ora, como certamente sabe também, um governo, qualquer governo, investido para uma legislatura, planifica as suas acções para timings que julga melhores para o País e para os seus interesses, como é normal.

Pois bem: quando, ultrapassada a metade do mandato, a partir do momento em que se esperava que o céu começasse a clarear a pouco e pouco, quando – ao contrário do que afirma – a cobrança fiscal aumentou substancialmente, aliás como vai verificar dentro em breve, por força do eficaz (não digo mais eficaz, porque antes não o houve, como sabe…) combate à fuga e fraude – eis senão quando, por constatar a efectiva possibilidade de as coisas começarem a endireitar-se, S. Exa – aquele que a gente sabe… - concertado com os interesses particulares do “seu povo” e de mais uns quantos a quem muito afectou o começar a tocar-se nos respectivos privilégios, puxou da caneta e, de uma penada, dissolveu a AR em gesto sem precedentes, legal é certo, mas também ilegítimo. Estava armada toda a encenação – canhestramente, claro, mas para quem não dispõe de capacidade para ajuizar criticamente e apenas consegue ver 5 centímetros à frente do nariz… - que conduziria, com muitas ajudas de gente bem colocada mas que não tem legitimidade para intervir da forma como interveio e de uns quantos “úteis” que, uns mais tarde outros mais cedo, acabarão por morrer da forma que morrem todos os traidores, à “estrondosa” vitória de quem tinha causado todo este aperto.

A História, como sempre, acabará por dar às coisas a medida certa e a cada um segundo o seu mérito.

É engano seu ou então engano que o amigo quer provocar-nos, o dizer que foram os dislates do governo Santana Lopes que deram azo ao que sucedeu. O que sucedeu, teria sucedido de igual forma, mesmo sem qualquer dislate. É que tudo não passou de acção concertada, delineada logo quando Durão Barroso deu conhecimento de que iria para Bruxelas, no caso de tal circunstância não ocasionar eleições antecipadas. E essa foi uma das razões por que o PR não dissolveu então, ou seja, se o PR tivesse dito que dissolveria se Durão se fosse, Durão não teria ido. A outra razão é que, naquela altura, o PS estava de tal forma desorganizado que não convinha nada, pelo que haveria que esperar algum tempo para que tudo lá serenasse e minimamente se compusesse. Foram os tais 4 meses!...

O que se passou foi isto e a História – uma vez mais a História – virá a demonstrá-lo, sem lugar a dúvidas razoáveis.

Não, amigo, não vou ao ponto de dizer que o PSD é o partido redentor. Já competente, sempre o direi, tendo em vista a confrontação com o “povo de Sampaio”. Porquê? Simples: Todas – anote bem, por favor, todas! – as reformas estruturais – e não apenas estruturais – feitas em Portugal (e não foram todas as necessárias) foram-no pelo PSD, ele só, ou por governos por si liderados. A começar em Sá Carneiro, a continuar pelo senhor Silva e por Durão Barroso e a terminar em… Santana Lopes que – imagine-se! – em 4-meses-4 e acossado por todos os lados, mesmo antes de ter sido nomeado PM, conseguiu reformar mais do que António Guterres, o PM maravilha - em 6-anos-6.

E é bom que não se esqueça de que algumas reformas não foram levadas a cabo porque, sendo necessária a concordância do PS, nunca tal foi conseguido, por se tratar de um partido imobilista e do mais conservador que se conhece.

Para que decidam se uma janela deve ser de vidro ou de plástico ou de outro qualquer material, necessitam de criar, no mínimo, 5 comissões, a saber: a primeira, para estudar o assunto; a segunda, para fiscalizar o estudo da primeira; uma terceira, para verificar se a fiscalização da segunda está a processar-se nos melhores moldes; uma quarta, para constatar que, afinal, ainda não foi feita a parede onde se deve meter o raio da janela e, finalmente (the last but not the least…), a quinta, para adiar tudo até se fazer um estudo sobre se se deve, ou não, construir a parede onde fique a janela.

A propósito: quer ter a gentileza de me indicar quais as grandes reformas – as pequenas também servem se outras não encontrar… - feitas pelos executivos socialistas de Guterres?

As coisas são como são e não há que fugir-lhes, não é verdade?

Cumprimentos e oxalá as coisas se componham um pouco desta vez. Não ponho nisso muita esperança, mas, que diabo!, esta deve ser a última a morrer...

Anónimo disse...

Caro Ruvasa,

Agradeço a sua nota sem acrimónia, antes salpicada de humor, assombrada desde logo com a sublime referência a Cervantes. Pequena (grande) ironia ou malícia?!
Compreendo perfeitamente porquê: custa mais a assumir o peso da verdade e a responsabilidade a ela inerente, do que ouvir a verdade.

O PSD sempre governou com maiorias absolutas. Quando não a teve procurou de imediato as alianças que lhe permitissem ter essa maioria — nem que para isso tivesse que vender a alma ao diabo (apenas uma força de expressão, sem qualquer relação religiosa).

O (des)governo da coligação PSD/PP tinha todas as condições para fazer as devidas reformas — as tais que os cartazes do PSD nas eleições legislativas diziam que o PS não tinha feito em 6 anos — e não as fez. Ao contrário do que afirma, esta coligação não precisava da concordância do PS — o tal partido “imobilista e do mais conservador que se conhece” — para fazer as tais reformas, por força da maioria de deputados dentro da AR. Coisa que o Sr. Guterres — um ser ignóbil que deve ter cometido parricídio, infanticídio, ou sabemos lá o que (porque de repente é a causa de todos os males) — teve que lutar por cada centímetro dentro da AR, para fazer aprovar alguma coisa.

As grandes reformas estruturantes, se as houve verdadeiramente, que o PSD fez tem dois pressupostos históricos: antes houve quem arrumasse a casa e tomasse medidas difíceis, nomeadamente junto do FMI; Portugal, beneficiou da entrada na Comunidade Económica Europeia e de todos os fundos que se lhe seguiram — o ouro do Brasil dos tempos modernos. Tendo em conta esta verdade histórica, podemos dizer que com a casa arrumada e com o dinheiro o Sr. Silva só fez o que lhe competia.

A esperança, como muito bem diz, é a última a morrer. Mas temo que a herança recebida pelo Sr. Sócrates e as medidas que este venha a adoptar me exijam mais alguns anos de sacrifício.

Cumprimentos.

José Manuel, 43 anos, arquitecto, Lisboa

Ruvasa disse...

Viva, José Manuel !

Permita-me que comece pelo fim.

Claro que – disso não tenha dúvidas – vai ter que fazer mais uns quantos sacrifícios. Isto é uma bola de neve. Ao princípio pequena, depois, à medida que avança, vai tornando-se maior, até que se mostrará impossível de controlar e nos submerge de forma avassaladora.

Quando não se atacam os problemas logo pela raiz, assim acontece. E é justo que seja. Que a vida não é só farra e viver à custa de outros.

A resposta ao fundo da questão, peço-lhe que a vá encontrar no post que a seguir vou inserir, intitulado “A formiga e a cigarra revisitadas”.

Apenas resta esclarecer que não vale puxar por louros de que somente parte cabe à cigarra. É que anteriormente à chegada da formiga que trabalhou por 10 anos, tinha havido, é certo, um primeiro saneamento, uma primeira arrumação de casa. Em que participaram as duas, formiga e cigarra. Com que méritos parciais de ambas? É que, sabe?, a formiga esteve em todas essas arrumações. A cigarra é que não. Mas em todas as desarrumações, bem, isso já é outra conversa…

Salve-se – faça-se essa justiça – o reconhecimento de que o PS não fez uma única reforma em seis anos. Já é um primeiro passo… Mas não foi apenas nesses seis. Foi igualmente em todos os restantes. Jamais as fez. Muito pelo contrário, algumas entravou. Sempre que aparecia uma que necessitasse da aprovação de 2/3 dos deputados, era certo e sabido: PS contra! É só ir às actas da AR. Ou ao arquivo dos jornais.

Cumprimentos e desculpe não continuar, mas tenho que ir levar a depauperada formiga a comer frugal refeição, que a leve a recuperar forças que, em breve, lá terá que vir gastar novamente, na faina caseira, ou seja, na limpeza e arrumação após mais um festim que está prestes a iniciar-se.